segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Filosofia de segunda

Vingança ou educação?

Não sai da mídia. Evidentemente, o seqüestro que resultou no trauma físico e psicológico da menina Nayara e na morte de sua amiga Eloá, chocou a todos.

Mas, emoções à parte, o que proponho aqui é uma análise sob outro ponto de vista: mais racional e menos sensacionalista.

A sociedade, assim como no caso do menino João Hélio e no da Isabela Nardoni, clama por punição. Mas, ao fazer isso, exige que tipo de justiça?
Amarrar o bandido no paredão e fuzilar a sua cabeça? Isso! Segundo a maioria do “respeitável público” (sim, porque esse caso virou um número circense ou uma minissérie), esse tiro devia ter sido disparado nas inúmeras oportunidades em que o meliante apareceu na janela.
Se de fato isso ocorresse, poderíamos nos considerar saciados?

Em sua obra “Crepúsculos dos Ídolos” Nitzsche afirma que todo aquele que exige justiça com ar de indignação é alguém que só percebe a própria dor e sofrimento como algo trazido “de fora” por outro. Esse indivíduo é incapaz de notar que o seu sofrimento vem do seu próprio instinto de vida enfraquecido e da sua incapacidade de criar algo afirmativo. Recrimina-se por não poder criar; cultiva o sentimento de raiva em relação àquele que cria e reage contra tudo diferente de si. Afirma a própria indignação, negando sua condição ressentida.

Para o filósofo, esse modo de pensar é fruto de uma educação niveladora e imbecilizante que ensina os indivíduos a serem meros “animais de rebanho”, desprovidos de singularidade. Numa palavra: fracos. Quem é fraco, precisa de apoio: no caso de um culpado.
A fraqueza está no anseio de vingança, pois alguém sempre tem que ser culpado pelo meu sofrer.

A discussão aqui sequer resvala numa apologia à impunidade.
O fato é que a vingança nada mais é do que um modo apequenado de ação.
O que deveria pautar o tema é a necessidade de analisar as causas produtoras de tamanha crueldade.
Por que não exigimos algo diferente como a educação preventiva e a renovação do conceito de cidadania?
Por que raramente vemos uma grande mobilização social (sem fins eleitoreiros) exigindo o cumprimento dos serviços públicos básicos?

Precisamos criar valores para além desse modo ressentido no qual nos atolamos, pois os ressentidos preferem a vingança e a punição ao invés de investir suas forças em educar. E não podemos nos esquecer que punir serve muito mais para amarrar do que para formar o homem.

9 comentários:

Rony Neves disse...

Concordo Matheus.
Além disso a mídia, com todo seu "poder", poderia (e deveria) ser uma importante ferramenta de cobrança junto ao governo, porém só o fazem, infelizmente, quando convém.
João Hélio, Isabela, Eloá, são apenas capítulos de uma história cujo final cada vez mais nos parece de impotência.

Raul Otuzi disse...

Sinceramente, Matheus, o que acha que revolta neste caso é a ação desastrosa da polícia, que permitiu a volta da outra menina.

Quanto à vingança, confesso que às vezes me sinto tentado a defendê-la.

Mas daí a lucidez vem à tona e clamo apenas por justiça.

E vingança e justiça são coisas bem diferentes, convenhamos.

Valeu!

Tarcísio Mello disse...

Eu, como pessoa instruída e educada que sou, muitas vezes nestas horas tento pensar da mesma forma de sociólogos, filósofos, etc. Mas não dá mais, apesar de respeitar, não concordo com a opinião demonstrada. O que o povo clama não é mais apenas por justiça, é por exemplo. Uma pessoa que faz o que este jovem fez, assumiu o risco de ser morto. Antes ele !!! O que tem acontecido é que situações como essas, não punidas severamente acabam servindo de exemplo pra outros jovens fazerem o mesmo. Só isso, obviamente não resolve o problema à longo prazo. Mas porque é que não podemos atuar em duas frentes ? Vamos ter que esperar o poder público e a sociedade acordar e mudar ? Até quando ? Devemos sim clamar por isso, mas precisamos indiscutivelmente de ações práticas agora.

J B Bastos disse...

Eu já perdí as esperanças neste mundo terreno, estamos caminhando a passos largos para nossa própria destruição.
Não ficarei falando sobre isso, senão estaria sendo mais um daquelas pessoas hipócritas e chatas tentando explicar as causas de tudo isso, ou onde está o "erro" da polícia neste, e ou em outros casos.
Peçamos ao Pai meus amigos por nós todos, pois só ele poderá dar um jeito nisso tudo.

Arthur Dib disse...

Nesse caso, inquestionável foi o erro da policia em deixar uma das vitimas voltar ao apartamento.
A invasão deve ser sempre a ultima opção, pois coloca o maior numero de vidas em risco. Por uma seqüência lógica, as vidas a serem preservadas, devem partir: 1º a vitima, 2º os policiais, em último a do meliante. Não foi isso q vimos! Por isso a minha concordância em usar atiradores de elite.
Bom, quanto à questão social, concordo que se deve investir na citada educação preventiva, mas isso não significa que não ocorrerão mais crimes dessa natureza, tanto é que isso também acontece em países chamados de “primeiro mundo”.
Concordo com o que o Tarcisio disse: “...situações como essas, não punidas severamente acabam servindo de exemplo pra outros jovens fazerem o mesmo”.
Uma punição exemplar, com certeza, inibiria a prática de crimes similares.
A punição não deixa de ser uma forma de educação! No contexto da Psicologia, a punição, “designa um estímulo aversivo que se segue a um determinado comportamento e que faz diminuir a probabilidade de que esse comportamento se repita”.

É isso!
Abraço a todos!

J B Bastos disse...

Não acho que a polícia agiu errado
Apenas agiu! Tinham que tomar uma decisão.
Se tivesse tomado outra atitude, os questionamentos seriam os mesmos, a intensidade a mesma.
A imprensa vive disso, transformam qualquer fato, em algo estratosférico, não que este sequestro não fosse importante, mais fatos como este acontecem sempre. Mais eles necessitam focar alguma história, e a Eloá foi a da vez, como a Isabela e outros tantos(as).
Esperemos por outros casos, pois este não será o último.

Anônimo disse...

Penso que a busca por justiça é a mesma busca pelo equilíbrio social (vale depois um complemento do nosso filosofo Matheus, com base nos contratualistas Hobbes, Rousseau, Lock). Já a espetacularização do acontecido faz parte das bizarrices naturais de nossa raça, tal como um cristão sendo comido por um leão, onde o Coliseu sede espaço às poltronas de nossa casa e o suporte disso tudo é a TV, estrutura que banaliza a violência e caminha contra a convivência mais harmônica, se é que ela possa existir. Além disso, o rapaz pode ser também analisado por uma anomalia social, um sujeito desviante que, por cagada, conseguiu fazer algo maior do que pensava, vai saber.
O que importa é que em breve teremos mais um lançamento nas “telinhas”, talvez mais uma criança (ou mulher) massacrada ou algum escândalo político, tudo com muita cobertura de nossos urubus jornalistas, esgotando o caso de maneira bem superficial e sem muita continuidade, pelo menos até quando der audiência.

Anônimo disse...

No seu texto você reprova um determinado tipo de comportamento.
E reprovar também é punir. Concorda?

Matheus Arcaro disse...

Fala Du.

Não necessariamente a reprova é uma punição.
E, mais que reprovar o comportamento, o intenção do texto é colocar em discussão a outra ou as outras possibilidades de vislumbrar o assunto.

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