segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Filosofia de segunda

Felicidade: à venda nas melhores butiques

Há tempos, praticamente desde o início da filosofia, a felicidade é analisada e discutida sob várias perspectivas.
O que é; como alcançá-la e a possibilidade de atingi-la, são algumas das questões inerentes ao tema.

Sócrates, cinco séculos antes de Cristo, acreditava que o propósito da vida humana era o alcance da felicidade. Esta somente seria possível mediante a um complexo processo dialético que passava pelo conhecimento, aproximando assim a felicidade da sabedoria.

Aristóteles, alguns anos mais tarde, pensava possível a felicidade, mas com muito trabalho. O meio para atingi-la seria a virtude que o homem possui naturalmente, o autoconhecimento.

Para Epicuro (341aC – 270aC), fundador do hedonismo, o prazer contínuo seria a chave de uma vida feliz, que poderia ser traduzido não por qualquer prazer (indulgência sexual, comida, bebida, bens). Ao contrário, o prazer que faz bem à alma, estaria numa vida simples, justa e virtuosa. Na moderação, na leitura e introspecção – o prazer do sábio – que tem controle de si mesmo.
A ambição seria a grande vilã da felicidade, pois, segundo Epicuro, esse sentimento de insaciedade conduziria o homem a buscar incessantemente mais do que o necessário para viver bem.

Sêneca (4aC – 65dC) dizia que o ser humano seria feliz se renunciasse aos padrões de referência de sua sociedade. “É preciso atentar para não seguir tal como ovelha o rebanho, porque, não sabendo para onde ir, vai-se para onde as outras se dirigem”.

Schopenhauer, no século XVIII, afirmava que a felicidade seria apenas uma interrupção da dor e do sofrimento constantes que as aparências geram. E, mesmo sendo fugaz, só seria possível, quando houvesse desapego e renúncia ao mundo.
Para ele, o homem “normal”, que procurava a felicidade fora dele mesmo, estaria sempre incompleto. Ora compraria casas de campo ou carros, ora daria festas ou faria viagens e os­tentaria grande luxo, justamente porque procura nas coi­sas de todo o tipo uma satisfação que é volátil.

Recentemente, A New Economic Fundation, com o objetivo de medir o grau de felicidade das pessoas, fez uma pesquisa e criou o índice Planeta Feliz.
No total, 178 países se classificaram pelos critérios: comparação entre a expectativa de vida, sentimento de alegria e quantidade de recursos naturais consumidos no país.
A surpresa: os primeiros colocados foram países latino-americanos que costumam povoar as últimas posições de qualquer lista econômica. O primeiro lugar ficou com o desconhecido Vanuatu, um arquipélago no Oceano Pacífico, que vive de pesca e agricultura. Os países mais ricos do mundo, como USA (150º) e França (129º) ocuparam as últimas posições, devido ao consumo desenfreado que destrói o ambiente e não é capaz de deixar seus cidadãos felizes.

Hoje, a felicidade, como que num processo de vulgarização, passeia gratuitamente pela boca das pessoas.
Talvez, a propaganda, que tem tratado de maneira leviana um tema tão relevante, tenha contribuído para isso.

Cabe-nos, primeiro como seres humanos, a reflexão sobre nossas próprias condutas. Segundo, como profissionais da comunicação, rever a abordagem desse e de outros temas. Após séculos de pensamento, não podemos reduzir a felicidade a uma frase convidativa abaixo de uma logomarca.

11 comentários:

Anônimo disse...

Olá Matheus, este texto é excelente e o questionamento melhor ainda.
Eu acredito que a felicidade é uma idéia que compartilhamos com toda a Humanidade e com os nossos antepassados. Como se fosse uma "bacteria" nos contaminando.

Raul Otuzi disse...

Belo post, Matheus.
Seu texto me fez lembrar de um outro:

A IDIOTICE É VITAL PARA A FELICIDADE - Ailin Aleixo. Ex-colunista da VIP

Gente chata essa que quer ser séria, profunda, visceral. Putz, coisa pentelha.
A vida já é um caos, por que fazermos dela, ainda por cima, um tratado do Schopenhauer? Deixe a pungência para as horas em que ela é inevitável: mortes, separações, dores.
No dia-a-dia, pelo amor de Deus, seja idiota. Ria dos próprios defeitos, tire sarro de suas inabilidades. Ignore o que o boçal do seu chefe proferiu. Pense assim: “Quem tem que carregar aquela cara feia, todos os dias, inseparavelmente, é ele…Pobre dele.”
Milhares de casamentos acabaram-se não pela falta de amor, dinheiro, sexo, sincronia, mas pela ausência de idiotice. Quem disse que é bom dividirmos a vida com alguém que tem conselho pra tudo, soluções sensatas, objetivos claramente traçados mas não consegue rir quando tropeça? Que sabe resolver uma crise familiar mas não tem a menor idéia de como preencher as horas livres de um fim de semana?
Sim, porque é bem comum gente que fica perdida quando se acabam os problemas. E daí, o que elas farão se já não têm por que se desesperar? Em suma: desaprenderam a brincar.
Eu não quero alguém assim comigo. A realidade já é dura; piora se for densa. Dura e densa, ruim. Brincar é legal. Entendeu?
Esqueça o que te falaram sobre ser adulto, tudo aquilo de não brincar com comida, não falar besteira, não ser imaturo, não se descontrolar, não demonstrar o que sente. É muito “não”. Dá pra ser feliz com tanto “não”? Pagar as contas, ser bem-sucedido, amar, ter filhos - tarefa brava. Piora, muito, com o peso de todos aqueles “nãos”.
Tenha fé em uma coisa: dá certo ser adulto e idiota. Aliás, tudo fica bem mais fácil ser for regado a idiotice, bom humor. Manuel Bandeira foi um grande homem e um grande poeta. Disse certa vez: “E por que essa condenação da piada, como se a vida fosse só feita de momentos graves ou só nesses houvesse teor poético?”. Estava certo.
Empine pipa!!! Adultos podem (e devem) contar piadas, ir ao fliperama, beliscar a bunda da sua mulher, sair pelados pela cozinha. Ser adulto não é perder os prazeres da vida - e esse é o único “não” aceitável.
Teste a teoria. Uma semaninha, pra começar. Veja e sinta as coisas como se elas fossem o que são: passageiras. A briga, a dívida, a dor, a raiva, tudinho vai passar, então pra que tanta gravidade?
Já fez tudo o que podia para resolver o problema? Parou, chorou, pediu arrego? Ótimo, hora da idiotice: entre na Internet, jogue pebolim, coma um churrasco grego.
Tá numas de empinar pipa no sábado? Vá.
Quer conversar com sua namorada imitando o Pato Donald mas acha muito boçal? E é, mas e daí? Você realmente acha que ela vai gostar menos de você por isso? Ela não vai, tenha certeza.
Só vai gostar mais, porque é delicioso estarmos com quem sorri e ri de si mesmo.
Eu fico chateado por não ser tão idiota quanto gostaria; tenho uma mania horrível de, sem querer, recair na seriedade.
Então o mundo fica cinza e cada lágrima ganha o peso de uma bigorna. Nessas horas não preciso de cenhos franzidos de preocupação. Nessas horas tudo de que preciso é uma bela, grande e impagável idiotice. Como sair pra jogar paintball - ou, melhor ainda, me olhar fixamente no espelho até notar como fico feio com os olhos vermelhos e o nariz escorrendo.
Como fico ridículo quando esqueço que tudo passa. Bom mesmo é ter o problema na cabeça, o sorriso na boca e paz no coração!!!!

Anônimo disse...

Se for para falar de felciidade, gosto muito d euma frase do Carlos Drumond: "A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade."

Anônimo disse...

Vixi!
Quer dizer que o Magazine Luiz com o seu "vem ser feliz", O Pão de Açúcar com "lugar de gente feliz" e o habib's com o fantástico "você feliz" me enganaram o tempo todo?

Anônimo disse...

Oi Matheus,muito bom o texto e o tema!!! Felicidade...é a busca constante de nós simples mortais.
A meu ver, todos os "GRANDES" citados por voce caminharam para decifrar o fenômeno felicidade.
E não me surpreendeu o resultado da pesquisa já que os latinos possuem uma filosofia de vida totalmente avesso aos outros "Grandes Países".
Eu mesma, creio que a felicidade está nas pequenas coisas (aquelas que os capitalistas consideram banais), é claro que precisamos de bens materiais, mais somente o necessário para sobrevivência, saber realmente o quanto de bens materiais eu preciso, não permitir que sejamos escravizados pelo material, nos permitir aqueles pequenos atos que nos causam realizações plenas como dividir um lanche com alguém carente, passar nosso conhecimento a outras pessoas, abraçar alguém que amamos, caminhar descalço na grama molhada...puxa!!! são ene coisas que nos causam felicidade.
Ai que eu acho que entra o Epecuro, para mim foi quem mais se aproximou, pois creio que a base de tudo está em saber dosar, achar o meio termo para tudo e para isso temos que adquirir conhecimentos para sermos sábios, assim aprenderemos a pensar, a nos questionar para saber o que realmente vale a pena, traçar ideais e lutar por eles, ir contrario a esses tabus impostos pela sociedade que na maioria só nos castra causando insatisfações.
É saber avaliar e valorizar um pequeno grande momento e vive-lo intensamente.
Agora mesmo, estou muito feliz, tive o privilégio de conhecer um jovem promissor, cujas tamanhas qualidades vão em contrário a essa época de futilidades e irracionalidade em que estamos vivendo.
-Esse jovem pra quem não sabe é o "SR. MODESTO".

Matheus Arcaro disse...

Grande comentário Raul. Já dizia um grande professor, Bento Prado, que a boa filosofia é a que ri da filosofia.
Concordo que não podemos nos tornar intelectóides sem graça, incapazes sequer de sorrir. Mas também não podemos aceitar o que nos é empurrado guela abaixo. Senão perdemos o nosso senso crítico.
Sejamos idiotas felizes, mas sempre cientes da idiotice.

Rony Neves disse...

Pra mim a idiotice está em buscar a felicidade no exterior, no material.
Felicidade não se compra no supermercado.
A felicidade está em Deus!
Não me refiro a uma igreja ou religião, mas sim nas atitudes de cada dia, como por exemplo ignorar um pobre coitado ao relento ou até mesmo deixar de aproveitar os momentos com a família e os amigos.
Porque só nos lembramos de Deus nos momentos difíceis?
O consumismo é vazio e, infelizmente, a propaganda contribui muito para esse buraco, "vendendo felicidade".

Anônimo disse...

Vivemos em tempos de predomínio do ter sobre o ser. E, muitas vezes, o ter é o próprio ser.
Viva Marx!

Anônimo disse...

De volta à realidade. Acho um tanto utópico a conclusão de buscarmos novos caminhos para a propaganda. A proposta de uma comunicação engajada nesse sentido tende para o discurso “compre se precisar, tenha menos ou o que for necessário para ser feliz” enquanto a Máquina Mercado manda dizer “Compre! Mesmo se já tiver, compre mais e seja uma pessoa melhor, mais bonita, mais gostosa, mais aceita, mais, mais e mais”. Felicidade vende e quero ver alguém dizer o contrário, tanto é que no complemento do Raul vemos a busca pela idiotice (ou ignorância de algumas parâmetros da realidade), caso contrário podemos riscar das campanhas “vem ser feliz”, “amo muito tudo isso”, “priceless” e muito outros sorrisos muito bem vendidos, como o nosso anônimo disse. Pensemos para chegarmos em um caminho razoável.

Anônimo disse...

Concordo com vc, Fábio.
Felicidade vende e a propaganda se aproveita disso.

Quem quiser comprar, que compre. Se acha que vai ser mais feliz através do consumismo, que seja.

Muitos só se realizam ao adquirir bens materiais. Ou se sentem bem simplesmente ao comprar marcas que tenham apelos à felicidade.

Faz parte do jogo.

Anônimo disse...

Esse Sócrates... me faz ter orgulho de ser de ribeirão-pretano.