Amigos! Amanhã estarei no Programa Fuzuê da Difusora FM - 91.3, às 15 horas. Sintonizem e vejam o que eu tenho a dizer.
O resultado do concurso: "O que significa kinambauê para você?" sairá no programa.
Kinambauê!
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
O Oráculo do Sexo estará no Fuzuê amanhã
quarta-feira, 15 de setembro de 2010
QUE DEMOCRACIA?
Ainda bem que vivemos num país democrático, comemoram muitos.
Mas, quantos destes já pararam para pensar: o que é, de fato, a democracia?
Etimologicamente: democracia origina-se do grego. Demos significa povo e cratos, força, poder, por conseguinte, governo. O dicionário moderno não foge à origem da palavra: regime de governo onde o poder de tomar importantes decisões políticas está com o povo. De fato, na Grécia Antiga era assim. Os cidadãos em praça pública tomavam as decisões que diziam respeito à pólis. Política e Ética eram indissociáveis. Logo, governar, necessariamente, visava o bem comum.
Claro que eram outros tempos; as cidades eram infinitamente menores. Mas, será por isso, que nem resquícios desse sistema chegaram até nós? Enriquecemos a questão ao analisarmos algumas sociedades indígenas contemporâneas ainda não contaminadas pela cultura branca (principalmente a Xingu). Lá, o chefe não manda (na acepção que temos do termo). O cacique é aquele que conhece a história, a cultura, as tradições, e transmite isso ao seu povo. É o grande mediador de conflitos. Não dá ordens porque não há delegação de poder. Sem delegação de poder não há repressão. Sem repressão não pode haver dominação de um grupo por outro grupo, ou de um indivíduo por outro. Isso aponta na direção das utopias: uma sociedade que não precisa ter poder. E proporciona uma vivência para nós quase inimaginável: alguém nascer e morrer sem receber uma ordem sequer. O índio, na força de sua cultura, é um ser absolutamente auto-suficiente. Sabe fazer tudo de que precisa para viver – plantar, caçar, pescar, sabe fazer sua casa, fazer seu instrumento, fazer seus objetos de adorno, sua rede, sua esteira, sua canoa. Nasce e morre sem depender de ninguém para nada. A informação é aberta; o que um sabe todos podem saber. Ninguém se apropria da informação para transformá-la em poder. Em suma: o que há é a democracia do consenso.
O filósofo francês Jean Jaques Rousseau, ainda no século XVIII nos alertou quanto à ameaça corruptiva da “civilização”.
Discursivamente, para Rousseau, no princípio de tudo, havia uma sociedade que mal se percebia. Ao “chegar” a civilização, começa-se a divisão em famílias e criam-se os afetos. Estes, por sua vez, geram o sentimento de posse, fazendo com que uns se destaquem em relação ao todo. O sentimento de superioridade do homem sobre os outros seres vivos e sobre outros homens faz com que ele adquira consciência de si e comece a sua transformação do “natural” ao “social”, pervertendo assim a sua natureza.
O homem civilizado regula-se pelo amor próprio. Ao contrário, o homem natural de Rousseau guia-se pelo amor de si (disposição voltada para a preservação do ser singular) e pela comiseração (repulsa natural ao sofrimento de qualquer ser vivo especialmente o humano). A desigualdade social, então, é iniciada no movimento de apropriação da natureza pelo homem. Nesse momento, faz-se necessário o Estado (governo) para conter a instabilidade. Mas, ao invés de resolver, funda-se a sociedade política que perpetua a dominação do rico sobre o pobre (crítica à monarquia absolutista de sua época).
Obviamente não se deve tomar em sentido cronológico nem literal o problema filosófico de Rousseau. O que ele propõe com seu sistema é um resgate da natureza humana. Mas de maneira alguma suscita uma volta ao homem natural. Ele pensa numa civilização racional e moral que realize a natureza do homem. Um sistema fundado na Vontade Geral, que projete o Eu Comum da humanidade. Vontade geral não como sinônimo de vontade da maioria (já que esta pode ser o somatório de vontades individuais). Vontade geral tendo como pressupostos a comiseração e o amor de si.
Não vivemos hoje num país onde, quando muito, prevalece o somatório das vontades individuais?
Talvez encontremos algumas saídas: a “democracia” brasileira é demasiada jovem. Da Constituinte até hoje, contam-se apenas 22 anos. Não temos parâmetro sequer para nos compararmos conosco mesmo.
Mas, o que dizer da alienação política que assola a nossa nação?
Assistimos aos escândalos que, por sua constância midiática, não mais escandalizam. Exaltamos a honestidade política como virtude ao invés de pressuposto.
Aplaudimos os discursos vazios do nosso Presidente que usa e abusa de frases feitas para ludibriar a população mais carente.
Conformamo-nos com programas assistencialistas que transformam o pobre em cárcere da esmola.
Observamos inertes à demolição ideológica do “partido dos trabalhadores” em detrimento à eleição presidencial, cabendo até conivência e apoio a antigos desafetos políticos.
Aceitamos o solapamento da liberdade com a obrigatoriedade do voto.
Etc. Etc. Etc.
Não. Definitivamente não vivemos numa democracia de fato. O que temos é uma democracia representativa com mofo nas entranhas. Um sistema manco no qual os representantes ainda dependuram. Uma política que flerta muito mais com o totalitarismo do que com a liberdade.
segunda-feira, 6 de setembro de 2010
GANHEI CORAGEM
(Rubem Alves – Colunista da Folha de S. Paulo)
"Mesmo o mais corajoso entre nós só raramente tem coragem para aquilo que ele realmente conhece", observou Nietzsche. É o meu caso. Muitos pensamentos meus, eu guardei em segredo. Por medo.
Alberto Camus, leitor de Nietzsche, acrescentou um detalhe acerca da hora em que a coragem chega: "Só tardiamente ganhamos a coragem de assumir aquilo que sabemos".
Tardiamente. Na velhice. Como estou velho, ganhei coragem. Vou dizer aquilo sobre o que me calei: "O povo unido jamais será vencido", é disso que eu tenho medo. Em tempos passados, invocava-se o nome de Deus como fundamento da ordem política. Mas Deus foi exilado e o "povo" tomou o seu lugar: a democracia é o governo do povo. Não sei se foi bom negócio; o fato é que a vontade do povo, além de não ser confiável, é de uma imensa mediocridade. Basta ver os programas de TV que o povo prefere.
A Teologia da Libertação sacralizou o povo como instrumento de libertação histórica. Nada mais distante dos textos bíblicos. Na Bíblia, o povo e Deus andam sempre em direções opostas. Bastou que Moisés, líder, se distraísse na montanha para que o povo, na planície, se entregasse à adoração de um bezerro de ouro. Voltando das alturas, Moisés ficou tão furioso que quebrou as tábuas com os Dez Mandamentos.
E a história do profeta Oséias, homem apaixonado! Seu coração se derretia ao contemplar o rosto da mulher que amava! Mas ela tinha outras idéias. Amava a prostituição. Pulava de amante e amante enquanto o amor de Oséias pulava de perdão a perdão. Até que ela o abandonou.
Passado muito tempo, Oséias perambulava solitário pelo mercado de escravos. E o que foi que viu? Viu a sua amada sendo vendida como escrava. Oséias não teve dúvidas. Comprou-a e disse: "Agora você será minha para sempre.". Pois o profeta transformou a sua desdita amorosa numa parábola do amor de Deus.
Deus era o amante apaixonado. O povo era a prostituta. Ele amava a prostituta, mas sabia que ela não era confiável. O povo preferia os falsos profetas aos verdadeiros, porque os falsos profetas lhe contavam mentiras. As mentiras são doces; a verdade é amarga.
Os políticos romanos sabiam que o povo se enrola com pão e circo. No tempo dos romanos, o circo eram os cristãos sendo devorados pelos leões. E como o povo gostava de ver o sangue e ouvir os gritos! As coisas mudaram. Os cristãos, de comida para os leões, se transformaram em donos do circo.
O circo cristão era diferente: judeus, bruxas e hereges sendo queimados em praças públicas. As praças ficavam apinhadas com o povo em festa, se alegrando com o cheiro de churrasco e os gritos. Reinhold Niebuhr, teólogo moral protestante, no seu livro "O Homem Moral e a Sociedade Imoral" observa que os indivíduos, isolados, têm consciência. São seres morais. Sentem-se "responsáveis" por aquilo que fazem. Mas quando passam a pertencer a um grupo, a razão é silenciada pelas emoções coletivas. Indivíduos que, isoladamente, são incapazes de fazer mal a uma borboleta, se incorporados a um grupo tornam-se capazes dos atos mais cruéis. Participam de linchamentos, são capazes de pôr fogo num índio adormecido e de jogar uma bomba no meio da torcida do time rival. Indivíduos são seres morais. Mas o povo não é moral. O povo é uma prostituta que se vende a preço baixo.
Seria maravilhoso se o povo agisse de forma racional, segundo a verdade e segundo os interesses da coletividade. É sobre esse pressuposto que se constrói a democracia. Mas uma das características do povo é a facilidade com que ele é enganado. O povo é movido pelo poder das imagens e não pelo poder da razão. Quem decide as eleições e a democracia são os produtores de imagens.
Os votos, nas eleições, dizem quem é o artistaque produz as imagens mais sedutoras. O povo não pensa. Somente os indivíduos pensam. Mas o povo detesta os indivíduos que se recusam a ser assimilados à coletividade.
Nem Freud, nem Nietzsche e nem Jesus Cristo confiavam no povo. Jesus foi crucificado pelo voto popular, que elegeu Barrabás. Durante a revolução cultural, na China de Mao-Tse-Tung, o povo queimava violinos em nome da verdade proletária. Não sei que outras coisas o povo é capaz de queimar.
O nazismo era um movimento popular. O povo alemão amava o Führer. O povo, unido, jamais será vencido!
Tenho vários gostos que não são populares. Alguns já me acusaram de gostos aristocráticos. Mas, que posso fazer? Gosto de Bach, de Brahms, de Fernando Pessoa, de Nietzsche, de Saramago, de silêncio; não gosto de churrasco, não gosto de rock, não gosto de música sertaneja, não gosto de futebol. Tenho medo de que, num eventual triunfo do gosto do povo, eu venha a ser obrigado a queimar os meus gostos e a engolir sapos e a brincar de "boca-de-forno", à semelhança do que aconteceu na China.
De vez em quando, raramente, o povo fica bonito. Mas, para que esse acontecimento raro aconteça, é preciso que um poeta entoe uma canção e o povo escute:"Caminhando e cantando e seguindo a canção.", Isso é tarefa para os artistas e educadores. O povo que amo não é uma realidade, é uma esperança.