Raulzito, lendo seu texto, lembrei-me de um poema que fiz no final do ano passado:
PASSAGENS
I-
Se fosse capaz, não escreveria.
A luta contra o papel é desleal,
De um prazer repugnante.
Os advérbios sangram pela ferida da razão,
Os substantivos fogem às luzes da cidade.
Resta-me adjetivar meus sentimentos,
Torná-los intimamente públicos.
Secreção neural!
Palavras,
Donzelas, se não conquistadas,
São metastaseadas ao Mundo Inteligível.
Há quem não as use,
Sequer as sente,
Quem as violente.
Talvez por isso se façam desdenhosas,
Pois quem é esbofeteado não esquece.
Volto a dormir...
A página mais branca que a minha pele,
Mais preta que meus pensamentos!
II-
Escrevo com uma caneta sem tinta.
A transposição é quase cirúrgica:
Das idéias ao papel,
O caminho é pseudomental,
Sublingual,
Entremeado por infindas vicissitudes.
Escrevo com uma caneta sem tinta.
Como o marceneiro sem martelo
E o filósofo sem presunção,
Não sou!
Camufladas sob meus preconceitos,
Abrigadas da versofágica Racionalidade,
Palavras, palavras...
Escrevo com uma caneta sem tinta.
Por favor, dê-me um lápis!
III-
Se o que sinto não pode ser escrito,
Por que insisto?
Instinto?
Vício!
Com a espada sobre o pescoço,
Incansavelmente escrevo,
Inalcançavelmente escrevo!
De costas para a gramática,
Para a sintaxe, os morfemas e a ortografia,
Escrevo sem métrica ou rima.
O que importa
Se o pronome é oblíquo ou reto,
Se os versos são heróicos ou sáficos,
Quando se escreve asfixiado pela vida?
Escrevo...
Porque sou analfabeto,
Porque sou tu, nós, eles.
Porque sinto medo!
Escrevo...
Com sangue diluído às lagrimas;
Com as chagas da utopia;
Com o coração que ainda pulsa fora do peito!
sexta-feira, 28 de maio de 2010
Escrever para que?
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3 comentários:
Não queria simplesmente adjetivar, mas fazer o quê?
Fantástico!
Como é bom voltar a postar por aqui !
Vish escrever é ótimo, já minhas dificuldades com a correção ortografica são imensas...
Mas....
Escrever te dá liberdade, liberdade para expressar o que tem de ser expresso, aqui que você imagina e não pode falar, aquilo que você simplesmente quer dizer, sem ter que fica se explicando, sem explicar o porque dessa vírgula se teria ou não um ponto ou um ponto e vírgula, escrever para sentir liberdade, para ser liver, escrever "S"erto o "C"erto o seu certo pode ser como quiser, afinal a liberdade no momento de escrever é de quem escreve, como é bom não ter correntes, nem conceitos, somente a vontade, sem precisar mudar as linhas, escrever ahnn fico feliz por poder sempre expressar as emoções contidas num simples pedaço de papel, e ao reler pensar "pu@# que Par%*" o como eu preciso corrigir muita coisa nesse texto, porém, fico feliz por poder escrever o que queria,basta ou vir a "Aquarela" com dois riscos tenho um guarda-chuva. escrever é isso quando nossos rabiscos fazem um sentido enorme para nós ...
POrra tem erro pra carelo nesse texto mais deu vontade eu escrevi ...
Que bom poder visitar o blog e ter postagens novas valeu galera
Valeu você, Rafael. O Rubem Braga, grande educador e filósofo, já escreveu várias vezes sobre a 'tirania' da gramática.
Abraço!
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